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domingo, 23 de agosto de 2020

Autonomia sexual e afetiva, uma caminhada.[PANDEMIA]

 Conversando com um boy sobre relações, ele me contou como era a dinâmica da relação aberta com a  ex-companheira. Contou que a relação já começou aberta por uma demanda dos dois. E que eles conversavam muito sobre isso, e que foi muito bom, enquanto eles conseguiram manter a honestidade um com o outro.

Eu fiquei muito curiosa sobre isso, porque para mim, a maior expectativa sobre as relações abertas é a possibilidade justamente de conseguir construir uma relação honesta, de fato. E não me refiro a honestidade que na verdade é controle sobre o corpo e subjetividade do outro. Falo da honestidade a partir da lógica onde é possível conversar, trocar,  sem medo que a conversa vire uma problemática sem fim para a relação. 

O que haveria acontecido então de desonesto numa relação aberta? Que tipo de desonestidade é possível construir numa relação onde supostamente o principal tabu do amor romântico é superado?

Então ele me disse que tinham alguns acordos, e que esses acordos iam acontecendo a medida que as coisas iam acontecendo na relação, se rolava algo que deixava um dos dois desconfortável, eles trocavam uma ideia sobre isso, e chegavam num lugar justo para os dois. Até que, chegaram em um acordo que a moça não cumpriu: não pode se apaixonar. Ou se apaixonam juntos por uma pessoa, ou evita-se a paixão. 

Então, como é isso?  Eu até acho que é sim possível evitar se apaixonar. Talvez pelo fato de trabalhar muito com a racionalidade e ao mesmo tempo com a minha potencia intuitiva divina. Acredito que há um momento que vc escolhe se jogar da ribanceira, ou recuar. 

Porém, quando você está ali, se envolvendo em alguma medida com alguém , o risco de você simplesmente não vê esse momento de escolha, e ir, é muito grande. Para ambos. Tanto para o homem quanto para a mulher. 

 ~No entanto, há uma falsa simetria nessa análise. 

A construção da autonomia afetiva e sexual para o homem e para a mulher é completamente diferente. 

A moça do caso acima citado, apaixonou-se por um rapaz, e escondeu isso do companheiro por conta do tal acordo, tentou levar as duas relações simultaneamente. Não quis ter que fazer uma escolha entre um e outro, porque sentiu que conseguia administrar as duas relações. Sim ela quebrou o acordo. Mas, um acordo de peso diferentes entre duas construções subjetivas com diferenças demarcadas por gênero. 

Sabemos, e muito bem, que o homem vivencia sua sexualidade afetividade de forma muito mais autônoma, e livre. Para um homem é muito possível viver uma relação muito sexual dissociada da afetividade, e ele sustenta isso por muito tempo. Afetivamente também, me parece ser muito mais tranquilo, para o homem manter-se afastado, impor um limite a si e a outra pessoa, de até onde ele se permite vivenciar a afetividade de determinada relação. 

De forma, geral, a sexualidade da mulher sempre foi o lugar do afeto. A sexualidade para nós nunca foi apresentada de forma dissociada a afetividade. O homem inciam sua vida  sexual com garotas de programas, ou na primeira oportunidade que apareça, seja lá com quem for. As mulheres "perdem a virgindade" com alguém especial, porque esse é um momento quase que sagrado. Isso tô falando de tempos modernos, quando as mulheres já nem precisavam " se guardar" para o homem que iam casar. 


[Eu lembro que queria perder minha virgindade com um boy que eu era apaixonada e pouco me importava se ele era tb por mim - isso já lido como libertário entre minhas amigas - e com 15 anos escolhi que seria assim e que seria na escada do prédio da minha amiga, pq era o lugar possível, e ele recuou. Disse que alí não era lugar para uma menina perder a virgindade.] 

P E R C E B A M:

Foi assim que aprendemos a vida inteira a nos relacionar com a nossa sexualidade. Sim, temos nos rebelado contra isso, e temos praticado e muito sexo sem compromisso, porém a construção da vinculação entre  sexualidade  e afetividade tem raízes muito profundas em nossa subjetividade e quase sempre estamos correndo riscos de nos apaixonarmos, porque a partir dessa lógica, e com outras costuras conservadoras e machistas sobre nosso corpo e nosso prazer , percebo que para muitas mulheres a realização sexual, a conquista do prazer está vinculado a intimidade. E para construir intimidade para gente é quase sempre pela via da afetividade, 

por isso,

não é justo, estabelecer um acordo como esse numa relação aberta. Se o risco da paixão é quase impossível de não de existir em nenhuma relação sob nenhuma hipótese... menos ainda é possível de garantir no contexto da subjetividade da mulher, onde prazer, sexualidade e afetividade andam sempre muito juntos.  

Sendo assim, a honestidade que defendo não perpassa somente pela verdade da palavra, pela linguagem que é usada nos acordos, mas na compreensão das relações de privilegio da masculinidade também, de que, dentro de uma relação heterossexual o homem reconhecer que a subjetividade da mulher carrega outras marcas e que determinados acordos além de injustos, são impossíveis de serem garantidos, porque simplesmente está fora do nosso campo de racionalidade.

Como se resolve isso? não seria. O que seria justo? um dialogo muito aberto e de auto percepção, sobre o que pode o homem e a mulher nas relações sexuais e afetivas, e a compreensão de as caminhadas nessa construção de autonomia acontece de forma e tempo diferentes , para todas as pessoas, e que se queremos estabelecer relações monogâmicas (aqui precisamos  ainda de mais cuidados e diálogos)  ou não-monogâmicas mais justas , é preciso reconhecer as marcas subjetivas marcadas por gênero sim.

Algumas mulheres vão construir isso de um jeito, e outras de outro, algumas já estão inclusive vivenciando suas sexualidades de forma muito autônoma, e outras , que vão precisar e mais tempo, e outras que se quer estão acessando as possibilidades discursivas que possibilitem que algum dia elas construam suas caminhadas.  


Falando de mim, já consigo pensar e entender bastante isso tudo, e acho bem escroto quando um homem questiona minha autonomia sexual e afetiva pelo que me conhece teoricamente, como se a teria e a racionalidade dessem conta de tudo, como se por saber de tudo isso, eu tivesse obrigação de dar conta disso. Isso é desconsiderar as profundezas das marcas subjetivas seculares.  Reconheço ainda minha pouca condição de vivenciar uma relação sexual plenamente prazerosa sem intimidade, e sem que essa intimidade esteja associada a uma afetividade.   


Quase sempre, a primeira vez que faço sexo com um homem é a porta de entrada ou não para construção de uma caminhada em direção a intimidade, sou cooptada com uma serie de informações, de ordem de afinidade  astrológica, existencial, espiritual, sexual, que me fazem desejar construir um cenário sexual de prazer e a partir daí, eu sempre estou no risco de me apaixonar. Eu não tenho condição nenhuma de assumir uma relação aberta, que me imponha como limite a garantia de que isso não vã acontecer. Porque caso eu faça isso, estarei rompendo com uma concepção muito importante para mim nas relações, que é a honestidade. 


Mas imagino como deva ser doloroso para uma mulher numa relação aberta, precisar se posicionar sobre isso, correndo risco de precisar recuar em vários sentidos. Nem sempre a gente consegue ser 100% coerente, nem sempre temos a possibilidade e a condição emocional de tomar a decisão certa, e as vezes tudo foge de nosso controle. E tudo isso vale pra relação monogâmica ou não monogâmica, mas se temos a honesta intenção de construir uma relação justa, precisamos ter o compromisso do diálogo e do processo de auto conhecimento, sem isso, nada acontece, tudo se repete. 



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